Há uma variedade muito grande de critérios de eufonia - e, sendo de carácter estético, o seu peso maior ou menor tem sempre um aspecto subjectivo também, o que se resume no dito popular que "gosto não se discute".
A questão de próclise ou ênclise envolve também a percepção de uma certa construção ser certa ou errada, segundo a norma culta. Assim o "eu te amo" nada tem, foneticamente ou em termos prosódicos, que o faça ser menos eufónico - mas a percepção de que está errado cria uma rejeição imediata.
Noutros casos, que não dependem de regras gramaticais, mas das formações ou sucessões de sons e de acentos, há uma variedade de critérios.
1. Evitar cacofonias. A própria definição de cacofonia é algo subjectiva, porque engloba termos vulgares e encontros sonoros "sugestivos", o que é difícil de definir. Minha impressão é que há tempos atrás, numa sociedade mais formal, tudo poderia ser sugestivo - aí deveria entrar o bom senso.
O "na nossa vida" nada me ofende os ouvidos, mas entendo que essas assonâncias evocam a linguagem infantil com vocabulário como nanar, pipi, xixi, cocó, ó-ó, bumbum, tautau, &c. Varias destas expressões evocam de forma inocente partes do corpo ou actividades fisiológicas. Será talvez por algum prurido semelhante que o consulente do Ciberdúvidas evitou até a sombra de sugestão desse vocabulário.
Há outro critério, muitas vezes subvalorizado, que é o da sucessão regular entre sílabas tónicas e átonas. Se alguém quiser escrever em prosa ou em poesia fluída, suave, tem de evitar o "solavanco" de duas sílabas tónicas seguidas - porque o fluxo natural dos acentos pede uma ou duas átonas após uma tónica (seja o acento principal ou secundário). Essa lei rítmica se observa tanto na música como na poética, que é outra forma de música.
Proparoxítonas são também de evitar, sobretudo nos finais de frase ou de verso. Se ocorrerem no meio da frase ou do verso, melhor se forem seguidos de palavra iniciada em acento tónico - assim não haverá mais de duas átonas seguidas.
Isto, é claro, num contexto de escrita poética ou semi-poética. Há poetas que escrevem em versos livres, belíssimos e musicais. Mas se não levarem em conta (mesmo que intuitivamente) a alternância entre tónicas e átonas, nunca irão fazer poesia.
Hiatos são também complicados, eufonicamente. Quanto mais contrastarem as vogais na sua abertura, mais inestéticos, sobretudo para o canto. Os hiatos são inevitáveis, é claro, fazendo parte de muitas palavras, e de encontros inevitáveis entre palavras. Mas o que é de evitar, onde quer que se queira um texto agradável sonoramente, é a sucessão de dois ou mais hiatos seguidos. E se nas sílabas em hiato houver ditongos, ainda pior, torna-se extremamente difícil uma pronúncia clara, articulada e natural. Por exemplo: "ele, o hiato, ele é o inimigo da eufonia, ele é o anti-eufónico por excelência". Veja a sucessão de vogais em sílabas separadas que começa a cada cláusula iniciada com "ele", além do "daheu" em "da eufonia".
Teoricamente, pode-se fazer elisão aqui e ali: mas onde quer que faca elisão, a sucessão infeliz de vogais só se torna mais confusa e incompreensível.
Em textos técnicos ou lógicos, cujo propósito essencial é transmitir objectivamente conteúdos, essas considerações são é claro irrelevantes. Por isso eu diria que eufonia, ou cacofonia, depende em muito e sobretudo do contexto.